"Haverá paradeiro
para o nosso desejo
dentro ou fora de nós?"
Paradeiro - Arnaldo Antunes
Nos dias 16 a 19 de Dezembro de 2010 reuniram-se na cidade de Santo Antonio de Jesus ativistas, pesquisadoras/res, estudantes, representante de entidades e pessoas que lutam no seu cotidiano pela livre orientação sexual e identidade de gênero no estado da Bahia.
Sem dúvidas, o IV Seminário do Fórum Baiano LGBT, mais do que importante, representou mais um marco histórico do movimento. Lésbicas, jovens, pessoas trans, queers, acadêmicos, ativistas, identitários, reuniram-se para legitimar o espaço mais democrático e amplo de construção da cidadania para pessoas LGBT e liberdade de orientação sexual e identidade de gênero no estado.
Não como um espaço homogêneo e igual, mas reconhecendo suas contradições e fazendo suas autocríticas, o Fórum é hoje, mais do que nunca, diverso. Diversidade esta que a todo momento foi defendida e reafirmada durante estes dias de seminário. Seja entre LGBT operadores de Segurança Pública, da Saúde ou dos Direitos Humanos, estavam ali não apenas as disputas e os diferentes locais de fala, mas o reconhecimento da importância de operar a política do movimento LGBT de novas formas, reconhecendo e dialogando com novas e mais qualificadas maneiras de luta.
Desde 2007, ano de refundação do nosso Fórum, as e os universitárias/os, de ativistas a acadêmicas/os, tiveram seu espaço conquistado, assim como as negras e negros, as e os jovens e pessoas LGBT que vivem com deficiência. A Diversidade é a nossa grande identidade. Somos diversos. Nos reconhecemos diversos. Operamos o reconhecimento da diversidade enquanto um campo amplo que nos organiza e que nos cabe.
Constatamos que uma das principais dicotomias ainda sustentadas por alguns setores do movimento LGBT, entre queers e identitários, não foi ponto de distanciamentos ou terrorismos daqueles que rejeitam, a priori, outras formas de compreender a nossa luta, o que vimos foi solidariedade e reconhecimento de que novas e possíveis estratégias existem e precisam ser, no mínimo, conhecidas, debatidas e respeitada por todas.
O Fórum amadureceu, seus e suas ativistas amadureceram, seu espaço enquanto campo político e de idéias já é uma referência.
As lésbicas e mulheres bissexuais tiveram seu espaço e realizaram uma das mesas mais produtivas de todo o encontro. Mais do que importante, a mesa sobre feminismos e lesbianidades foi histórica, mostrando a importância de dialogar sempre mais amplamente do que nossas imediatas demandas e aprendendo com as mulheres lésbicas como é importante construir um movimento protagonizado também por elas. O feminismo nos ensina muitas coisas, entre elas, como nas palavras que ouvimos das próprias ativistas lésbicas, a necessidade de estar sempre alerta. Após este seminário todas saímos com essa idéia e estamos sempre alerta para com as nossas posturas, nossas falas, nosso comportamento político.
Um ponto bem ressaltado também no seminário foi a questão da visibilidade. Precisamos estar visíveis. Seja na história, sejam nas políticas públicas, seja nas transformações do dia-a-dia, nos planos, nos projetos políticos, na vida cotidiana, na disputa de poder.
O contrário, a invisibilidade, pode até ser um direito de cada um, mas não pode ser mais tomado como o lugar natural onde nos colocam, nos calam e nos violentam. É preciso dar visibilidade a nossas demandas, a nossas organizações, a nossa política, a nossa indignação frente a violência e a exclusão que nos atinge.
Sem dúvidas, para o próximo período, o enfrentamento a violência deve ser uma das nossas principais e centrais metas. O enfrentamento a todas as formas de violências que atingem as sexualidades e, mais especialmente, as pessoas LGBT.
É necessário que pensemos para o próximo período a construção de uma ampla e solidária Rede Estadual de Mapeamento e Combate a Violência contra LGBT no Estado da Bahia, onde os grupos, coletivos, redes da capital, do interior e das Universidades tenham o papel de pontos focais dessa articulação.
A violência que nos mata, mas que também nos machuca, nos expulsa de casa, nos exclui dos ambientes de trabalho, educação, cultura, lazer, deve ser não só detectada por nós, mas combatida como um atraso a vivência plena da cidadania e a construção da própria democracia.
O Comitê Estadual de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT terá um importante papel na articulação de melhores condições para a política e para a população LGBT. É preciso ter nítido o seu caráter temporário, pois o que realmente queremos e precisamos é um Plano Estadual LGBT, uma Coordenadoria LGBT e um Conselho Estadual LGBT. A partir desse tripé o Estado da Bahia terá a estrutura mínima para lidar e operar a política para a população LGBT.
O Fórum tem uma grande responsabilidade sobre este Comitê, pois além de ter sido um dos responsáveis pela pressão social que o instituiu, das 8 entidades da sociedade civil que compõe o Comitê, 6 são filiadas ao Fórum.
No plano do Legislativo é preciso sair da inércia. A Assembléia Legislativa da Bahia (ALBA) é uma das mais atrasadas do país, até hoje nenhum Projeto de Lei foi aprovado, seja de punição a estabelecimentos públicos e privados por homofobia, seja de reconhecimento do uso do nome social de pessoas Trans ou de reconhecimento de datas comemorativas do Movimento, como vemos já aprovados e regulamentados em diversos estados do país. O principal desafio que teremos no próximo período será a articulação de uma ampla Frente Parlamentar LGBT, que seja forte, atuante e articulada na ALBA e junto ao movimento LGBT do estado.
O retorno para casa traz um conforto de parte do dever cumprido, no caminho da volta, refletimos sobre os novos desafios abertos para os próximos anos. Novos diálogos, novos projetos, novas propostas, novos conflitos. Experimentar o Fórum Baiano LGBT tornou-se mais do que importante a todo movimento baiano, tornou-se indispensável a construção da luta pela livre orientação sexual e identidade de gênero no estado da Bahia.
Que o novo Colegiado do Fórum, assim como as suas atuais 50 filiadas e demais grupos e pessoas parceiras/os promovam muita luta rumo a construção de uma sociedade cada vez mais justa, radicalmente democrática e livre.
Viva a diversidade do movimento LGBT da Bahia!
Viva o nosso Fórum Baiano LGBT!
* Ricardo Santana é mestrando em História (UEFS), membro do Kiu! - Coletivo Universitário pela Diversidade Sexual, ex-membro do Colegiado Executivo do Fórum Baiano LGBT e representante do Kiu! no Comitê Estadual de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT do Governo do Estado da Bahia.
** Vinícius Alves é estudante da Graduação em Gênero e Diversidade (UFBA), Coordenador da Associação Beco das Cores - Educação, Cultura e Cidadania LGBT e representante da entidade no Comitê Estadual de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT do Governo do Estado da Bahia.
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