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terça-feira, 16 de março de 2010

Por uma Psicologia engajada: Defenda a Resolução 001/99!

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Recebemos recentemente, do companheiro Toni Reis, presidente da ABGLT, um informe o qual revela que, um grupo de psicólogos, liderados pela psicóloga Rozangela Justino, da Abraceh (Associação de Apoio ao Ser Humano e à Família), tem conclamado profissionais a lutarem contra a Resolução 001/99, que trata das normas de atuação para os psicólogos em relação à questão da orientação sexual.

Para quem não sabe, Rozangela Justino é graduada em Psicologia, e participa do Movimento Pela Sexualidade Sadia. É evangélica, e em 2009 sofreu reprimenda pública do CFP por insistir em oferecer “cura” para a homossexualidade em seu consultório.

Nesta correspondência, Rozangela propõe que seus pares se mobilizem para ganhar a maior quantidade possível de delegados regionais, a fim de influenciar na Conferência Nacional de Psicologia, que deve ocorrer de 03 a 06 de junho de 2010. Nesta conferência, serão votadas e estabelecidas as diretrizes do CFP para o próximo triênio. Com a maioria dos delegados favoráveis às ideias defendidas por ela e pela associação, será possível, dentre outras coisas, a revogação da Res. 001/99.

SOBRE A RESOLUÇÃO

A conquista da Resolução 001/99, de 22 de março, que completou no ano passado uma década de validade, colocou o país na vnaguarda do movimento de despatologizaçã o da homossexualidade, e enfraqueceu a tendência de controle disciplinar sobre o corpo, enquanto aparelho institucional.

A resolução atende à uma tendência político-conceitual da psicologia e da psiquiatria em afastar-se de uma modelização médica, de onde veio, e na qual predomina o binômio doença-cura. Nesse modelo, diversas práticas sociais são classificadas como “patológicas” apenas porque desviam-se da prática comum aceita moralmente pela sociedade. A psicologia, nesse contexto, vem cumprir um outro papel político, a partir do seu corpo de saberes: esclarecer questões ligadas à sexualidade no sentido de ampliar a consciência social e combater o preconceito e a discriminação.

Diferenciando o tratamento psicoterapêutico, o conselho não impede que o profissional atenda uma pessoa de orientação homoerótica que esteja em situação de sofrimento, desde que em acordo com o artigo 3o da Resolução:

Art. 3° – os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados.

Parágrafo único – Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades.

Assim, um processo terapêutico envolvendo a questão da sexualidade jamais deve ter como objetivo uma pedagogia, no sentido de dar à demanda do cliente um direcionamento exógeno, mas atuar de modo terapêutico, auxiliando-o a compreender suas dificuldades e barreiras, para que ele possa livremente exercer a sua sexualidade, seja ela qual for.

DE UMA PSICOLOGIA DOGMÁTICA E DISCIPLINAR

A partir do final do século XVIII e durante todo o século XIX, as ciências humanas, em particular a psicologia, no rastro da psiquiatria, substituíram o conhecimento dogmático teológico como instância normativa e de controle estatal das produções ético-estéticas do corpo.

De uma produção enunciativa sobre o corpo advinda do poder igrejal, de cunho dogmático-teoló gico, passou-se gradativamente a uma outra enunciação, que se quis mais próxima das ciências, embora, sob um exame mais apurado, não tenha abandonado o discurso da moral. tudo em nome de uma produção enunciativa de saberes que permitam não apenas o controle, mas toda uma ciência sobre o corpo, no sentido a que o filósofo Michel Foucault dá ao termo biopolítica (o controle social através da positividade, de uma apropriação semiológica das produções coletivas).

A norma é colocada então do ponto de vista de um discurso positivo sobre o corpo, que estabelece o normal e o patológico, muitas vezes a partir de preceitos de ordem moral. A masturbação é um exemplo. De pecado, no discurso igrejal, passa a patologia e/ou a comportamento gerador de doenças, na psiquiatria clássica.

A antipsiquiatria, a reforma psiquiátrica e a desinstitucionalizaçã o são movimentos políticos dentro da psiquiatria (também tocando a psicologia) que questionam a estrutura teórico-conceitual das ciências psy, enunciando uma outra forma de terapêutica, tentando libertar do arcabouço teórico ligado às ciências naturais e à visão normativa ligada estreitamente a uma moral de classe.

Moral essa que impregna uma psicologia de cunho normativo, que tem menos um objetivo terapêutico que uma pedagogia pautada na doutrina das igrejas neopentecostais.

Assim, ainda temos uma sociedade que abre espaço para certos tipos de conduta profissional, onde a enunciação da psicologia, que se quer científica, se confunde com a dogmática igrejal, e onde os profissionais são menos terapeutas do que fiscais da moral e censores do comportamento alheio. O que não existe em uma psicologia engajada, que pretende fugir do estereótipo alienado de ciência a serviço da servidão humana e da normatização.

ALIANÇA POLÍTICO-AFETIVA

Daí a necessidade de todos os psicólogos, envolvidos ou não com esta questão específica, atuarem no sentido político, e não apenas funcional. É preciso ser terapêutico dentro e fora do ambiente profissional. Seja candidatando- se a delegado regional, seja escolhendo bem quem serão seus delegados, ou mesmo conversando com as pessoas ao seu redor, é preciso utilizar a psicologia não como força reativa-coercitiva- normatizante, mas como potência terapêutica no enfraquecimento de uma subjetividade apassivadora.

Disseminar saberes, dizeres, estimular a produção política, ético-estética das pessoas, engajar-se. Tornar esse mundo um lugar onde a discriminação e a homofobia (como de resto, todas as formas de violência semiótica) não sejam apenas rejeitadas, mas criar um ambiente onde elas não sejam sequer possíveis. Enfraquecer os estereótipos, disseminar saberes e dizeres que permitam às pessoas produzirem seus próprios entendimentos sobre as coisas e sobre o mundo. Ou como afirmou o filósofo Martin Buber: “abrir a janela e convidá-las para ver o mundo”. E não vê-lo por elas.

Quando isso acontecer, não haverá mais necessidade de defender o ser humano e a família. Nem de psicólogos dogmatizados.

Mas enquanto não chegamos lá, é preciso defender os mecanismos e ferramentas existentes para que a psicologia possa ser cada vez menos instrumento de normatização e censura, e cada vez mais um corpo de saberes e dizeres de ampliação da consciência social. E a Resolução 001/99 é um deles.

Por isso, o mote desta campanha é para que os psicólogos conheçam o que diz a resolução, e disseminem a sua importância científica e política. Defenda o livre exercício da psicologia, no engajamento do existir, para além das armadilhas do corpo.

Não delegue o seu fazer a um sacerdote da moral; se engaje!

Baixe aqui a resolução 001/99 na íntegra.

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