Em janeiro de 2010, na 5ª Conferência Regional da ILGA-LAC - Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, pessoas Trans e Intersex - um grupo de mulheres se reúne com a finalidade de construir uma rede, cujo conteúdo central é a desconstrução da lesbofobia nas pesquisas de cunho científico. Sentíamos que naquele momento era possível dá o primeiro passo, uma vez que éramos algumas de nós ligadas ao mundo da pesquisa, e ao mesmo tempo, claramente insatisfeitas com a manipulação de dados estatísticos sobre as mulheres lésbicas.
O desejo de construir “algo” que nos déssemos à voz mais legitimada á desconstrução da heterossexualidade compulsória e do patriarcado foi o impulso inicial. De um lado, contávamos com a presença de lésbicas ativistas, oriundas de organizações não governamentais. Do outro lado, pesquisadoras doutoras, mestrandas, graduandas em fase de TCC. Neste sentido, era uma presença em carne e osso de experiências advindas de dois lados que por vezes se constrói como opositores. Possivelmente, este seria o primeiro entrave para se estabelecer um diálogo e ações mais frutíferas voltadas para um projeto coletivo e utópico.
Seguindo em frente na Conferência da ILGA as tessituras eram criadas não com afetividades, mas sim, com afinidades eletivas, sabíamos que éramos vilipendiadas por sermos encapsuladas numa identidade que nos fazíamos a Outra, que não santa, que não puta, que não mulher, mas sim, como alcoólatras, como passionais, como um ser abjeto.
Enfim, nos reunimos éramos oito completaríamos a nona, e assim, convidamos a companheira transexual lésbica, porque sabíamos que a nossa identidade deveria não ser simplesmente aquela que nos enquadraram, mas sim, uma re-invenção de uma categoria política que não nos levássemos às novas exclusões. Assim, foi de um desejo que surgiu a rede de pesquisadoras lésbicas.
No sábado a rede é lançada oficialmente, mas foi no dia anterior que havíamos construídos os nossos primeiros objetivos, abaixo elencados:
Objetivo geral:
Estimular produções científicas elaboradas por pesquisadoras lésbicas, visando a desconstrução de conceitos/ideologia s heterossexistas, patriarcais, capitalistas, racistas e lesbofóbicas.
Ojetivos específicos :
- Produzir conhecimento para a desconstrução dos conceitos e das análises que tem matriz heterosexistas, patriarcais, capitalistas, racistas e lesbofóbicas.
- Mapear as produções científicas elaboradas pelas lésbicas;
- Contribuir para a difusão da produção em publicações científicas reconhecidas;
- Promover a articulação entre as lésbicas pesquisadoras e os movimentos sociais;
- Apoiar sistematização das experiências de trabalhos realizados por organizações lésbicas ou outras organizações que desenvolvem intervenções voltadas para esta população;
- Promover espaços de discussão e reflexão sobre as produções acadêmicas das lésbicas pesquisadoras;
- Destacar a contribuição na construção do conhecimento das lésbicas pesquisadoras;
Depois da fundação, fomos todas para a casa, Jandira Queiroz inicia o gerenciamento dos emails para uma comunicação conjunta. Este email também seria uma forma de contato com outras lésbicas, e assim foram recebidos emails escritos por lésbicas que desejavam ingressar na rede, desta forma um problema ou uma solução aparece, mas precisa ser discutido, e nasce a questão: Quais são os critérios para a inserção de novas pesquisadoras lésbicas na rede? As fundadoras iniciam o debate, ainda não concluso, não por falta de interesse ou objetividade, mas sim, por estarmos situados no terreno das articulações entre a academia e o movimento social. Estamos atentas que não devemos nos submeter a um processo de colonização, tampouco ser consideradas não cientificas, muito embora, entre nós exista um desejo de sermos conscientes de que apostamos em uma nova epistemologia que caminha na teoria marxista, na teoria feminista crítica, na teoria lésbica, na teoria queer e na teoria da descolonização. Todas estas perspectivas partem da idéia de que o sujeito investigador é um sujeito de carne e osso, e não meramente, uma artificialidade dicotômica da tradição descartiana.
Outro passo importante para o fortalecimento da Rede, foi a criação do blog, uma iniciativa maravilhosa, mas precisa ser amadurecido e discutido mais democraticamente, de toda forma somos nós com as nossas individualidades que nos lançamos e oferecemos a nossa face. Não para apanhar, mas sim, para nos fortalecermos em nossas afinidades, e este é um momento ímpar de nossa história política.
No dia 29 de março de 2010, foi lançada a filial de nossa rede, com pesquisadoras baianas. Mais uma vez baiana, enquanto identidade política. Neste lançamento contamos com a presença de Mitchelle Meira – Governo Federal; Jandira Queiroz - Movimento social e Fundadora da Rede Internacional de Lésbicas Pesquisadoras; Geisa Santos, nova pesquisadora da rede e também representante do Governo Estadual (SEPROMI) e do Movimento Social e Suely Messeder professora da UNEB e doutora em antropologia, Fundadora da Rede.
A mesa é bastante representativa daquilo que nós desejamos, enquanto pesquisadoras lésbicas, nela tivemos a possibilidade de diálogo com o poder público, a presença clara dos movimentos sociais com a frutífera interlocução com a Universidade do Estado da Bahia. Éramos quatro mulheres interessadas em mostrar a nossa identidade, enquanto lésbicas, e ao mesmo tempo, mostrávamos as nossas singularidades, nós baianas com as nossas questões etnorraciais, nós pertencentes à rede com os nossos desejos de desmontar a presunção desta matriz heteropatriarcal, racista, misógina.... Que nos subjuga e nos torna a OUTRA.
Suely Aldir Messeder
Coordenadora do Núcleo de Gênero e Sexualidade – Diadorim
Professora doutora em Antropologia da Universidade do Estado da Bahia
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