O fracasso da Igreja Católica em impedir a adoção do casamento homossexual na Argentina mostra que o clero, outrora tão poderoso, está perdendo sua influência no país.
A lei, que também autoriza adoções, foi aprovada na semana passada sob aplausos de centenas de casais homossexuais reunidos diante do Congresso. A Igreja se opunha à mudança, qualificando a família homossexual de 'perversa'.
'Não sejamos ingênuos: esta não é só uma luta política, é uma estratégia para destruir o plano de Deus', disse o cardeal arcebispo de Buenos Aires, Jorge Bergoglio, numa carta aos parlamentares antes da votação.
A Cidade do México e o Uruguai já irritaram o clero conservador ao aprovar uma medida similar no ano passado, e outros países vêm se encaminhando para adotar leis socialmente mais liberais.
PERDA DE INFLUÊNCIA
'Evidentemente a Igreja tem perdido presença e influência a respeito de decisões políticas, o que é parte do processo de secularização', disse Ana María Bidegain, professora de estudos religiosos na Universidade Internacional da Flórida.
'As pessoas ainda são católicas e ainda acreditam nos fundamentos... mas não concordam mais com o que diz (a Igreja) a respeito da moralidade', afirmou.
Uma das razões citadas por ela para a perda da influência católica é a urbanização da América Latina, onde há mais espaço para as pessoas vivenciarem o catolicismo 'do seu jeito.' Outro fator lembrado pela estudiosa são os casos de pedofilia envolvendo padres do mundo todo.
O deputado argentino Ricardo Cuccovillo, do Partido Socialista, acha que o clero ainda tem forte influência sobre alguns parlamentares que 'não entendem que a Igreja tem um papel apenas no campo da fé, e que os deputados têm um papel a desempenhar no campo da democracia.'
Ele lembrou que muitos dos regimes militares latino-americanos da década de 1970 tinham fortes vínculos com a Igreja, e na opinião dele a redução da influência católica é parte do aprimoramento democrático.
'Outros países avançam em outras áreas, e nós avançamos nos direitos dos homossexuais, e assim complementamos uns aos outros na região. Acho que nesse caso em particular a aprovação da lei terá um efeito de atração (para que outros países façam o mesmo)', disse o deputado.
Aparentemente temendo que isso ocorra, o arcebispo de Lima, Juan Luis Cipriani, pediu nesta semana aos políticos peruanos que não deixem a questão dos homossexuais dominar a campanha para uma eleição regional de outubro.
'Acho que não há necessidade de imitar a Argentina', disse ele à imprensa local.
Fonte: Folha de São Paulo
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