A campanha eleitoral, a intolerância, a militância LGBT e o que esperar de Dilma? Marcelo Gerald questiona
por Marcelo Gerald
Dilma Rousseff (foto acima) iniciará o governo com uma grande base de apoio, a oposição no Senado reduziu muito e seu governo deverá encontrar menos dificuldades que o atual. Mas para a causa LGBT, existem evidências de um governo simpatizante e favorável? Haverá empenho em aprovar questões relavas a causa LGBT?
Antes de falar sobre o que devemos esperar da nossa nova presidente, eu não posso deixar de lamentar o seu mau assessoramento durante a campanha, Dilma evitou em falar sobre direitos dos LGBT e tocou somente quando questionada. Por diversas, vezes enquanto candidata afirmou que o casamento era algo do universo religioso, parecendo desconhecer o que diz o nosso Código Civil no artigo 1512: “O casamento é civil e gratuita a sua celebração.”
Sobre PLC122/06, parece ter tido acesso apenas ao texto antigo, já que o texto atual da lei não pune pastores que pregarem dentro de suas igrejas. A campanha contra Dilma foi marcada pela intolerância e pela boataria. O discurso conservador com caráter nazista chamou a atenção de autoridades quando ofendeu nordestinos, felizmente a discriminação regional já está prevista como crime e agora cabe ao Ministério Público tomar providências.
Ofender nordestinos é racismo inaceitável e deve ser punido de forma exemplar, mas esta questão levanta o quanto os LGBT estão frágeis legalmente. Ofensas bem parecidas são feitas todos os dias nas redes sociais, no Orkut existe comunidade que prega estupro à lésbicas e espancamento a gays, ataques à paradas e não adianta denunciar à Google que a empresa não toma nenhuma providência. Isto evidencia como a falta da lei faz com que as pessoas aceitem a discriminação.
A militância LGBT e o fogo amigo – Sobre o rumo que a militância irá tomar a partir da vitória de Dilma, destaco a importância do movimento LGBT em superar seus obstáculos internos. Existe uma enorme dificuldade em se construir uma agenda continua de atuação. Não dá para homossexuais culparem todos os políticos pela falta de sua organização. O “fogo amigo” tem sido mais danoso que os opositores à causa. Existe dentro do movimento pessoas que levam a causa a sério e são constantemente taxadas de radicais por relativizadores da causa, está na hora deste grupo sair da adolescência, se os LGBT não defenderem sua própria causa quem o fará?
Como Exemplo do que falo, cito o texto lamentável publicado no blog da Diversidade Tucana. Eles colocaram a eleição de Dilma como retrocesso à democracia. Infelizmente, o amor ao partido colocou a causa em segundo plano pra estes militantes. Em nenhuma das publicações recentes a Diversidade Tucana apoiou o PLC-122/06 ou cobrou do candidato derrotado um posicionamento favorável.
Agenda da militância – Outro indício da falta de uma agenda à militância é que não existe por parte da mesma nenhuma luta oficial pelo casamento civil e parece que parte dos LGBT sofre do mesmo medo que os presidenciáveis tiveram ao tratar o tema. Medo de confundirem com o casamento religioso. Não seria mais produtivo informar, desmistificar e lutar por reconhecimento e igualdade de direitos?
O desgaste existirá de qualquer forma, não diferindo se o movimento vai lutar por união estável, união civil, ou casamento civil. Os opositores a direitos LGBT farão as mesmas afirmações e acusações, a boataria e as mentiras contra os direitos civis tem sido sempre as mesmas ao redor do mundo.
Exemplo disto ocorre atualmente na Espanha em que setores conservadores tentam derrubar o casamento civil já aprovado. O que quero dizer com isto, é que o outro lado sabe a diferença destes institutos. Eles sabem que homossexuais não lutam por casamento religioso, mas interferem mesmo assim e espalham mentiras conforme sua conveniência para ganhar apoio da população. Cabe ao próprio movimento se vai lutar por igualdade ou por migalhas.
Projetos ultrapassados – Atualmente existem no Congresso apenas projetos já ultrapassados a respeito da União Estável, não existe nada a favor do Casamento Civil, ou União Civil com igualdade de direitos. A vitória de Dilma representou a resistência e a derrota do discurso que apoiou a oposição. O discurso da intolerância e da discriminação, mas agora não importa mais se você é simpático ao partido dos trabalhadores ou ao tucano, pois é com Dilma e com um congresso a seu favor que tudo deverá ser negociado.
O que vejo como importante neste momento, é uma militância disposta a cobrar, informar e pressionar para que seus direitos estejam em pauta na Câmara, no Senado e no Executivo. Dilma embora tenha o congresso a seu favor não governará a invisíveis. E o que esperar de Dilma Roussef?
Nós tivemos pequenos avanços no governo Lula. Foi pouco perto das expectativas, mas vimos em Dilma boas chances de dar continuidade aos projetos iniciados no governo atual. A presidente já sentiu na pele o que é ter Direitos Humanos negados, a tortura, a opressão e o machismo. Dilma tem se mostrado disposta a integrar o Brasil e de abrir o diálogo entre diferentes focos de interesses.
Sangue novo – Somado a isto, contamos com uma nova injeção de ânimos no Congresso. Jean Wyllys, o primeiro deputado homossexual assumido com plataforma pró-LGBT está eleito e pode amadurecer propostas. Marta Suplicy, que volta ao legislativo como 1ª senadora eleita por São Paulo, também sinalizou positivamente apoio à causa e Magno Malta e Marcelo Crivella, que antes eram severamente contrários à causa têm demonstrado abertura a discutir o PLC-122/06, segundo divulgou Toni Reis, da ABGLT.
Malta já tinha sinalizado abertura ao diálogo com a comunidade LGBT, conforme reunião divulgada por militantes do Espírito Santo na comunidade Homofobia Já Era em agosto deste ano. Na época, eu confesso que estava descrente, mas se o senador está mudando o seu posicionamento. O diálogo é bem vindo. Espero não estar sendo ingênuo e que o senador não esteja apenas fazendo jogo de palavras.
Pairam dúvidas – Sobre o PLC-122/06 ainda pairam dúvidas, um substituto pode atrasar ainda mais o andamento do projeto, a relatora atual, a Senadora Fátima Cleide, não foi reeleita, mas aguarda o julgamento de Ivo Cassol (PPS-RO), que responde processo da Lei Ficha Limpa. Não posso deixar de prestar minha solidariedade à senadora que defendeu com coragem o projeto e por isto a campanha adversária usou das mesmas falácias contra a lei para atacar sua candidatura.
Espero que a Senadora consiga voltar e se não for desta vez que dê continuidade a sua carreira futuramente, mas caso não possamos contar com seu apoio quem assumirá o projeto? O cenário é politicamente favorável e alguns dos mais conservadores não foram reeleitos, cabe agora à militância fazer sua parte, acompanhar e pressionar, senão amargaremos mais quatro anos de espera.
Fonte: Mundo Mais
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