A professora transexual Sayonara Nogueira, 37 |
Sayonara explica que nunca se sentiu gay, mas sim como uma mulher no corpo de um homem - uma sensação comum a todas as transexuais. Temendo sofrer discriminação ao se assumir, ela resolveu estudar e se firmar na carreira por meio de concurso público antes de correr atrás da mudança física. E não foi fácil.
No ano passado, a professora sofreu humilhação de uma inspetora, que insistia em chamá-la pelo nome do registro civil. “Ela falou que eu era Marcos até provarem o contrário”. Inconformada, ela acionou o Ministério Público e, após um processo, teve assegurado o direito de ser chamada pelo nome que escolheu.
Se a inspetora tivesse chamado Sayonara de Marcos nos dias de hoje, estaria violando uma nova resolução do governo mineiro que entrou em vigor neste mês. A partir da resolução 8496 de 2011, fica assegurada às pessoas transexuais e travestis a identificação pelo nome social. Este é mais um passo que Minas Gerais tem tomando nos últimos meses para garantir direitos a gays, lésbicas, travestis e transexuais no Estado (leia mais nas reportagens ao lado), que saiu atrás, comparando com outros Estados.
Na prática, o nome social será adotado em documentos de identificação funcional, comunicações internas do governo do Estado e durante o atendimentos em hospitais, delegacias, escolas e qualquer outro órgão público.
A resolução é conjunta e envolve as secretarias estaduais de Planejamento, Orçamento e Gestão, além da de Desenvolvimento Social. Ela não prevê punições para quem violar o novo regulamento, mas determina que agentes públicos passem por capacitação para cumpri-lo.
Walkiria La Roche, coordenadora especial de Políticas de Diversidade Sexual e primeira transexual a assumir cargo público em Minas.
“Pra gente que é transexual e travesti foi um ganho muito grande, um passo muito a frente. Em uma escola que trabalho já usam meu nome social. Em outra, colocavam os dois nomes. Sou Sayonara, identificada como Sayonara e não tinha por que não ser”.
Walkiria La Roche, coordenadora especial de Políticas de Diversidade Sexual, explica que não existem levantamentos sobre o percentual de travestis e transexuais no Estado. “O próprio censo esteve na minha casa e não perguntou sobre isso. Os dados são precários”, conta ela, que é a primeira transexual a assumir cargo público em Minas Gerais. A coordenadoria da qual é responsável foi criada neste ano pelo governo Antonio Anastasia (PSDB). “Existem outros Estados com iniciativas parecidas, mas desconheço uma com alcance tão amplo”.
No Rio de Janeiro, lei sobre a adoção do nome social por travestis foi publicada em 11 de julho deste ano. Também existem orientações governamentais no sentido de adotar o nome social em Alagoas, Bahia, Ceará, Goiás, Pará, Paraíba, Paraná, Piauí, Rio Grande do Sul, Santa Catarina.
Já em São Paulo, o decreto 55.588 de 2010 trata do assunto e prevê, inclusive, medida no caso de violação. Pela lei paulista editada pelo então governador de São Paulo José Serra (PSDB), o descumprimento da norma resultará em procedimento administrativo. Durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a partir de uma portaria da União, de 19 de maio de 2010, também ficou assegurado o direito do uso do nome social por travestis e transexuais em todas repartições do governo federal.
Mudança de sexo
Teve aluno no sexto ano que me viu de um jeito e três anos depois conheceu a Sayonara. Tudo foi muito acolhedor. Nunca sofri qualquer preconceito da comunidade escolar, nem de alunos nem de pais. Por incrível que pareça, sofro mais preconceito dos colegas de trabalho"
Há 11 anos lecionando em duas escolas públicas, a transformação de Marcos para Sayonara (a palavra significa adeus, em japonês) foi observada por seus alunos e por toda a comunidade escolar. Ela começou a tomar hormônios e fez implantes a partir do ano 2000, logo no começo de sua trajetória profissional.
“Teve aluno no sexto ano que me viu de um jeito e três anos depois conheceu a Sayonara. Tudo foi muito acolhedor. Nunca sofri qualquer preconceito da comunidade escolar, nem de alunos nem de pais. Por incrível que pareça, sofro mais preconceito dos colegas de trabalho. Mudamos a condição sexual, mas caráter não se muda”, diz ela, professora de geografia e história para alunos da sexta série do ensino fundamental ao primeiro ano do ensino médio, que têm entre 11 e 14 anos.
A professorra de Uberlândia se prepara para fazer a cirurgia de mudança de sexo no começo do próximo ano, em Goiás. Ela conta que é mais fácil conseguir a mudança do registro civil de sua identidade após a cirurgia, uma vez que existem juízes que entendem como necessária a mudança de sexo para a mudança do nome perante a lei. “Soube de uma moça que conseguiu sem a cirurgia, mas o nome de registro de nascimento foi mantido. Eu prefiro esperar”, diz ela, que mora com a mãe e o companheiro, mostrando que o preconceito ainda está muito longe do fim.
Fonte: iG
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